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Metanol: o álcool mal-vindo

Lascando o consolo dos seres de carne e osso!

Por Cleverson Israel 18 min de leitura

O mês de setembro de 2025 foi marcado, no Brasil, por notícias dando conta de que muitas pessoas, mais de duas centenas, em diferentes Estados da federação, tiveram problemas sérios de saúde ao ingerir bebidas alcoólicas, em cujo teor se verificou a presença de metanol. Esse metanol poderia estar ali por ter sido deliberadamente adicionado, o que é mais provável, ou por derivar espontaneamente do processo de produção. As empresas, que comercializam bebidas alcoólicas, dispõem de técnicas para identificar e retirar o metanol do produto voltado ao mercado de consumo. Coincidência ou não, o metanol é associado a outra espécie de ilicitude, pois ele é empregado para adulterar combustível de veículos de locomoção terrestre. Vários óbitos foram constatados. Algumas pessoas tiveram perda parcial ou provisória da visão, enquanto outras, lamentavelmente, padeceram perda total e irreversível da visão. Alguns destes tristes incidentes consumaram-se em estabelecimentos da área nobre de São Paulo. Portanto, ninguém está a salvo. Por maior e mais eficiente que seja a equipe de fiscais do referido Município, é certo que o Poder Público não dá conta de estar todos os dias, em todos os pontos de venda de bebidas alcoólicas, na terra da garoa. Isto significa que é necessário que haja uma conscientização por parte da pessoa do comerciante. Não se pode adquirir produtos oriundos de unidades de fabricação que não sejam fiscalizadas pelos órgãos competentes. Isto não impede, aliás, que em ações judiciais de responsabilização, figurem no polo passivo tanto o Estado, na qualidade de responsável objetivo presumido, e os estabelecimentos e seus representantes. As consequências, aos imputados, são administrativas, cíveis e penais. Tempos atrás eu lia uma matéria jornalística, descrevendo episódios idênticos, no continente asiático. Para mim foi um alerta. Ao que parece, o flagelo não abarca todo tipo de bebida alcoólica. É encontradiço em bebidas curtas, como gim, uísque e vodca. É preciso estar atento para lacres rompidos ou tortos, rótulos desalinhados ou desinformados do endereço de procedência e do número do lote. Bebidas de menor teor alcoólico, que não são destiladas, mas fermentadas, como vinhos e cervejas, em princípio, não estariam abarcadas pelo problema. Essa situação reforça a recomendação de acordo com a qual sempre se deve fazer consumo de bebidas (e de alimentos) prezando pela moderação. Sobrevindo suspeita de intoxicação, pelo motivo cá exposto, a vítima deve receber tratamento hospitalar o mais rápido possível. A intervenção médica pode fazer toda a diferença se for perpetrada em tempo oportuno. As ocorrências aludidas realçam a relevância do primeiro setor, como regulador e fiscal, do segundo setor. O mercado não pode ser deixado entregue a si mesmo. A busca por lucratividade deve respeitar regras das mais diversas naturezas. Em alguns pontos de venda foram encontrados lotes de bebida sem a correspondente nota fiscal. Então, para o contribuinte que não suporta pagar imposto, fica a lição: a exigibilidade da nota fiscal, de entrada e saída, dificulta a aquisição de alimentos e bebidas não certificados. A estrutura fiscal concorre não só para os interesses do fisco, como titular do crédito tributário, senão ainda para a saúde e o bem-estar da pessoa do consumidor. A estrutura fiscal extrapola a relação financeira, entre administrado e Administração (Pública), fazendo-se alçar à consecução de objetivos parafiscais, in casu, oferta de bens e serviços seguros, saudáveis, verificáveis. Se o metanol pode destruir o motor do seu automóvel, imagine o que ele não faz com o organismo humano. Essas circunstâncias reforçam a necessidade de nos organizarmos enquanto sociedade, a começar pelo exercício do voto, direcionando a concessão de mandatos a pessoas sensíveis para com a saúde da comunidade. Num plano mais profundo, emerge hialina a fragilidade da existência humana, suscetível a contingências análogas a estas, a respeito de que transcorremos. Nunca é demais lembrar que, condutores de veículos, não podem estar alcoolizados. A propósito, o uso gastronômico de álcool, de alguma forma, encontra paralelo no trânsito: é uma maravilha colocar-se atrás de um volante e fazer em minutos uma trajetória que nossos ancestrais faziam em dias; no entanto, o trânsito é desafiador, o motorista não pode entregar-se à distração. Igualmente, não é viável abolir o consumo de álcool, ele faz parte da civilização e de sua história. Parte considerável do progresso que temos hoje deve-se ao consumo de álcool. Por conseguinte, a bebida alcoólica, de fato, é essa prerrogativa perigosa para maiores de 18 anos: é preciso administrar essa “coisa”, é preciso, como se diz, “saber beber”. Como tudo o mais na vida: sexo, dinheiro, poder, etc.