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Uma grande nação sem timoneiro

Ao léu!

Por Cleverson Israel 17 min de leitura

Em carta datada de 09 de julho de 2025, Donald Trump ameaça o Brasil com tarifação de 50% sobre seus produtos de exportação, caso não haja o encerramento dos processos judiciais contra Jair Bolsonaro. O preposto norte-americano alega que a motivação da iniciativa seria uma relação comercial insustentável entre os dois países. Mas a realidade desmente a declaração. Os Estados Unidos da América têm tido balança comercial superavitária com o Brasil nos últimos anos. O presidente Lula foi enfático: “Não aceitaremos interferência ou tutela de ninguém”. A propósito, só um verdadeiro estadista é capaz de proferir uma assertiva com esse teor diante da maior potência do planeta – ao menos ainda por enquanto, não sabemos por quanto tempo os ianques ocuparão esse status. Realmente, à luz do direito internacional, trata-se de uma intervenção ilícita. Para a ordem global é necessário que observemos um direito internacional mínimo. Carecemos de estar firmados sobre axiomas jurídicos basilares e universais, a fim de não se recair na mais pura arbitrariedade. Urge que preconizemos princípios como a soberania dos Estados nacionais, a não intervenção e a autodeterminação dos povos. Fazer coerção econômica para romper a malha jurídica mundial é um verdadeiro banditismo, um grande saque em desfavor das nações menos desenvolvidas. Condicionar a suspensão de uma ameaça, barganhando de antemão o resultado de processos judiciais versando sobre a liberdade de políticos alinhados com potências estrangeiras, é uma intromissão indevida e gravíssima. É a anteposição de interesses particulares sobre a validade de normas universais. Os norte-americanos estão derruindo uma ordem mundial que eles próprios criaram. O desgoverno republicano está danando a ordem mundial. Malferindo o planeta inteiro, e sua própria pátria, pois há fortíssimas objeções à prática tarifária adotada, inclusive quando o foco são os interesses norte-americanos. O tiro está saindo pela culatra, pois as medidas decretadas forçam os países a estabelecerem parcerias alternativas, o que acentua o papel da China como fornecedora e cliente, o que seria, para os ianques, a antítese do desejado. A ordem jurídica mundial já é um problema em si mesma. Esse estatuto trata a todos como iguais, o que não deixa de ser uma boa ideia de certo ponto de vista, mas desconsidera que, fazer prevalecer a igualdade, já é uma injustiça. Nações de diferentes dimensões territoriais, de diferentes perfis demográficos, de diferentes níveis de desenvolvimento de técnica, são tidas como idênticas, formalmente como tais. Isso desde logo é um problema, porque sabemos que essa igualdade não existe concretamente. Nas relações comerciais com os países mais fortes, os pequenos sempre ficam em relativa desvantagem. Ora bem, é esta ordem, desvantajosa para os pequenos, que Trump está questionando. Para os norte-americanos, as relações assimétricas não lhes satisfazem mais, eles querem sair lucrando ainda mais em desfavor dos pequenos. Tem lógica? É uma aberração, uma teratologia jurídica. É a completa ausência do direito e da ética. Esperamos que a diplomacia ianque salve a América, porque os políticos estão desorientados e perdidos. A China tem demonstrado muito mais compostura. A serenidade das potências asiáticas contrasta com o comportamento disruptivo e intempestivo dos norte-americanos. Um modelo geopolítico multipolar é a solução. Os norte-americanos perderam completamente o rumo. Trump, prometendo tornar, mais uma vez, a América grande, fê-la pequena, diminuta. As pérolas do mundo do conhecimento, Harvard, Massachusetts, Stanford, instituições nas quais já fui aluno a distância, estão esmaecidas financeiramente. De centro planetário de conhecimento, que abrigava estudantes de todas as partes do globo, deslocaram-se para a condição de instituições de menor prospecção, de alcance interno. A imprevisibilidade é inimiga da segurança jurídica. O voluntarismo inconsequente contrasta com a racionalidade. Os norte-americanos não apenas inovaram, mas o fizeram no pior momento e da pior forma. Os brasileiros e o mundo estão fazendo votos para que as pessoas iluminadas, que integram a grande nação norte-americana, se articulem politicamente para tomar as rédeas do poder de decisão. Queremos ver o rosto bonito da América. Aquela América dos intelectuais, dos libertários, dos constitucionalistas, dos fundadores da pátria. Nós, brasileiros, acreditamos no poder do trabalho, da inteligência humana, da amizade entre os povos, de uma ordem jurídica internacional estável e isonômica. Diálogo é luz, articulação política é luz, composição de interesses e modulação de decisões são luz!