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Tecnologia: uma relação entre meios e fins

Vinculando o "como" ao "para quê"!

Por Cleverson Israel 17 min de leitura

Notícia, de 11 de junho de 2025, informa que a empresa CELESC, Centrais Elétricas de Santa Catarina, realizou o trabalho de lançamento de cabos condutores entre o bairro Jardim América, em Mafra, Santa Catarina, e o bairro São Judas Tadeu, Rio Negro, Paraná, empregando como agente operador do cabeamento a tecnologia de drone. A interligação elétrica cobriu um vão superior a quatrocentos metros. Foi um procedimento econômico, tecnicamente bem-sucedido, poupando trabalhadores humanos de colocarem em risco sua segurança pessoal. Assim que comecei a ler o fato noticioso, imediatamente me recordei do uso massivo de drones na Guerra da Ucrânia e Rússia. O pensador alemão Jürgen Habermas há muitas décadas realiza esse debate: afinal, para que as tecnologias são projetadas? Devem elas ficar reféns de projetos econômicos e militares? Qual a razão de existir da ciência? O frankfurtiano defende que devamos superar esse modelo de razão, uma razão puramente instrumental. Filósofos e sociólogos deveriam fazer uso da razão para vincular o aparato técnico-material a fins eticamente valorosos e bem-intencionados. O drone, em si mesmo, não é solução, mas pode servir de solução, não é o problema, mas pode tornar-se problema para quem dele é alvo. O drone pode ser uma máquina de matar, ou um recurso a garantir a segurança de um servidor público. Projetar e construir um drone requer conhecimento de várias áreas, a depender, inclusive, daquilo que se pretende fazer com essa máquina voadora. Se, entrementes, o conhecimento é importante, não é desimportante a sabedoria, traduzível nas justificativas racionais e compromissadas com a ética, encetada ao uso para o qual o equipamento é concebido. Os exemplos poderiam se multiplicar. Um laboratório pode ser usado para desenvolver vacinas ou armas biológicas. O que é certo? A ampliação da rede elétrica atende a indústria, esse espaço onde seres humanos desenvolvem (dignamente) o labor de que tiram sua fonte de subsistência. Ela atende, ainda, hospitais, onde procedimentos de saúde da mais capital relevância se destinam ao salvamento da vida e do bem-estar de seres humanos. A expressão numérica de nossa espécie, nessa terceira década do século vinte e um, reflete em muito os avanços que fizemos na ciência e na técnica. Paradoxalmente, nossa espécie corre perigo por tudo quanto nós mesmos inventamos, e que pode fazer sobrevir aos seus autores o próprio colapso. Refiro-me, de modo especial, a três tecnologias: armas nucleares, biotecnologia e inteligência artificial. É aqui, que deve entrar em cena, outra grande arte, que colocamos em circulação: a política. Não foi à toa que gênios, como Platão e Aristóteles, dela se ocuparam. A política é a resolução do conflito pelos meios não belicosos. Não precisamos nos agredir e nem sermos violentos. Ou, para retroceder um pouquinho mais, recordar a mais bela atitude de Sócrates, a propositura do diálogo. Não devemos comprometer a coexistência, em nome da melhor colocação na hierarquia global. É curioso que, muitas invenções, preconizadas para atuarem no ambiente de guerra, acabaram recebendo finalidades civis. Não deixa de ser uma esperteza. Apenas me pergunto da razão por que o esforço envidado colimava, em princípio, ser um aparato com potencial ofensivo, e, tão somente em nível de colateralidade, serviu para um uso decoroso. Parece não haver nada que possa parar a máquina de guerra de Israel. Um palestino relatou que “vamos ao funeral, como se fosse uma ida ao mercado”. Por aí se vê a banalização da maldade e da desumanização. Todavia, do lado do ofendido, o líder do Irã verbaliza: nossa reação “não terá limites”. Como alguém, apegado à religião, pode prescindir de limites? Ser ilimitado não calharia como prerrogativa exclusiva de Deus? Nossas ações – e reações – não devem ter por limite aquilo que é correto, e recomendado pelas Escrituras? Num mundo, onde a lógica da religião e a lógica da filosofia parecem ter chegado ao ocaso, restam apenas a técnica e a ciência, controladas pelas mãos de líderes políticos, imbuídos de muito pragmatismo de curto prazo, e nenhum princípio moral. Eu creio que essa discussão deve constar na grade curricular da educação regular. Um dia, Vladimir Putin, Volodymyr Zelensky, Donald Trump, Xi Jinping, Benjamin Netanyahu e Ali Khamenei estiveram nos bancos escolares, ao cuidado de uma pedagoga. Para quem ainda insiste em dizer que a filosofia não serve para nada, esclareço uma vez mais: a filosofia se presta a uma tomada de consciência, a uma metarreflexão: o que vamos fazer com o que estamos fazendo? Você já parou para pensar por que trabalha, para que paga imposto, e o que o governo faz com o valor da arrecadação? Ainda não? Pois comece imediatamente. Se deixar para depois, pode ser tarde…