Os efeitos do agir, da Providência Divina, no mundo, são verdadeiramente estrondosos. Entretanto, isso não anula o estilo eleito pela mão de Deus, sempre preconizando a discrição e a sutileza. Em que pese o protagonismo do Espírito Santo, parece ter se confirmado a mais previsível lógica (humana). Não foi coincidência ou evento randômico a entronização do primeiro papa norte-americano. João Paulo II representou a dicotomia do povo polonês, obrigado a conformar-se à política socialista, ainda que católico na esfera privada. O papado paulino veio a representar a vitória do catolicismo sobre o socialismo soviético. Na sequência, temos Bento XVI, seguindo as pegadas do pontífice polonês, caracterizado por declarações progressistas nas leituras sermonais, ao passo que a doutrina teológica apegava-se a diretrizes fortemente conservadoras. Todavia, diferentemente do seu antecessor, Bento XVI não teve meios-termos, e exibiu-se conservador sem ressalvas ou hesitações. O comunismo ateu foi, na perspectiva ideológica e social, o primeiro grande oponente de peso a rivalizar com o cristianismo católico global. Natural, portanto, que a cúpula dessa organização religiosa não medisse esforços em promover o desmonte da frente socialista internacional. Bento XVI, à época Joseph Ratzinger, enquanto chefe do departamento de doutrina da Igreja, só era menor que o próprio papa, João Paulo II. Por conseguinte, com o falecimento do “atleta de Deus”, era altamente previsível que Ratzinger, de longa data o favorito, viesse a galgar o pontificado. O antissocialismo de Ratzinger, como no caso de Karol Wojtyła, mobilizou os conservadores cujos votos catapultaram sua eleição. Empós dois conservadores, um progressista foi selecionado, Jorge Bergoglio, intitulado “Francisco”. A escolha do argentino procurou ir ao encontro dos católicos latino-americanos, há décadas migrando para igrejas cristãs neopentecostais. A escolha do nome visou criar uma identificação justamente com aqueles mais necessitados e excluídos dos bens produzidos pela humanidade. Falecido Francisco, foi a vez de o conclave sagrar papa o norte-americano Robert Francis Prevost. Apesar do “Francis” no nome, escolheu o nome de Leão XIV. De longe, os Estados Unidos da América são um país de protestantes. Em certo sentido, os Estados Unidos da América são o resultado lógico da cultura ocidental, e a prova de sua suposta supremacia. No entanto, a hegemonia planetária dessa potência vem sendo colocada em xeque pela mudança conjuntural da economia mundial. Sendo assim, a escolha do ianque favoreceria o restabelecimento, no plano simbólico, da grandeza dessa potência setentrional. O viés leonino da escolha do nome mostraria que a América poderia ser grande (outra vez) abraçando o cristianismo católico. A oposição Washington versus Roma seria dissolvida em favor da mais perfeita síntese diplomática, desdobrável no econômico, no político e no espiritual. Em tempo, Donald Trump foi apenas o segundo presidente norte-americano católico. O primeiro foi John Kennedy, e já sabemos o que aconteceu com ele. Além de falar sobre o que aconteceu, é interessante falar sobre o que não aconteceu. Não foi eleito, parece óbvio porém não desimportante, um papa europeu. A Europa, o que é consabido, não está passando pelo seu melhor momento. E eleger um papa alemão ou ucraniano não resolveria nada, e sequer ditaria algum tipo de tendência. Falando agora, um pouco sobre o perfil de Leão XIV, ele foi missionário no Peru e conhece bem a cultura latina. Essa experiência faria dele um perfeito representante do continente americano, na medida em que ele pôde conhecer as duas Américas, a anglo-saxã, em tese rica, e a hispânica, menos próspera. Cristo morreu por todos, e o cristianismo é para todas as classes sociais. Se o mundo pode ser comparado a um tabuleiro de xadrez, devo reconhecer que os cardeais jogam muito bem. O novo papa passa a impressão de ser uma pessoa bastante saudável. Não sabemos quanto tempo durará seu mandato. Não será de assustar se o próximo santo padre vier a ser um chinês ou africano. A expectativa é de que o novo papa desafie os governos dos países ricos, principalmente o governo norte-americano, a ceder obstáculos estruturais que reforçam a desigualdade entre as pessoas no mundo, neste exato instante, em que o monopólio da moeda mais forte e dos recursos energéticos acham-se combalidos pela pujança chinesa e do BRICS. Que este seja o ponto de inflexão: a substituição da força pela caridade. Que nasça um jeito novo de fazer política no plano global. Bela escolha! Cristãos e homens e mulheres de boa vontade, brancos e negros, ocidentais e orientais, estão torcendo por Leão XIV. Que seu pontificado seja de muita luz!