O mundo de ponta-cabeça
A desgastada discussão, que remanesce sempre atual!
Por Cleverson Israel 18 min de leitura
A partir de 26 de maio de 2025, os professores da rede estadual paulista, tanto efetivos quanto não efetivos, das escolas em tempo parcial, passaram a ser avaliados por estudantes e membros da gestão escolar. Periodicamente, é feito um relatório de desempenho, de acordo com essas tais avaliações, empregando cores como referência: verde, amarelo e vermelho. É a inversão total de valores. É a prevalência da lógica de mercado num ambiente, por definição, superior ao mercado. Se, como diz o texto, os avaliadores, de fato, fossem os estudantes, ainda vá lá. A verdade, entretanto, é que, dentre milhares de alunos, só se tira meia-dúzia ou menos de estudantes. Historicamente, foi sempre o professor que avaliou os alunos, e, agora, as coisas estão às avessas. No que toca a empoderar a gestão, no sentido de convertê-la, também ela, em avaliadora, faz dos burocratas os donos da instituição de ensino, pois ela se torna coisa e propriedade sua, tirando e colocando em seus quadros quem bem quer. São atribuições e competências distintas: é muito diferente cuidar de contabilidade e aspectos administrativos, e avaliar conhecimento de uma matéria e a pertinência de um método didático. Os professores vêm sendo opressos das formas mais variadas possíveis: baixa remuneração, e, portanto, estresse financeiro, alta cobrança pela gestão, obrigação de preencher plataformas com planejamento da aula, relatórios, avaliações, etc., desprestígio social, ataques em redes sociais e em podcasts, perseguição política, e por aí afora. Se o aluno vem do Ensino Fundamental e, por suposto, até o início da exposição dos conteúdos de Ensino Médio, nada conhece a respeito, com base em que, ele dirá que o professor é proficiente ou não? O aluno está sendo forçado a dar uma opinião sobre um assunto em relação ao qual ele desconhece em absoluto. Outra ingerência que temos visto é a forte intromissão dos pais, em muitos dos casos com menos formação do que seus filhos que frequentam a unidade escolar, questionando não só as metodologias de trabalho, senão até mesmo os conceitos-chaves empregados nas disciplinas, como se não existisse ciência, e tudo fosse uma questão de fé ou alinhamento político. O aluno deixa de ser aluno para se tornar cliente. E o cliente é uma pessoa a ser agradada, e não de quem se faz exigências ou cobranças. De autoridade, o professor é reduzido a alguém que procura contar com a misericórdia e boa vontade, de pessoas mais jovens e menos experientes do que ele. O aluno se sobrepõe ao professor, a criança ou adolescente se sobrepõe ao adulto, o ignorante se sobrepõe ao conhecedor, o não vivido se sobrepõe ao vivido. O professor é convertido em palhaço ou animador de plateia. O aluno é colocado na posição passiva de noiva, ele precisa ser conquistado, e o professor, tem de ser, como se diz, “carismático”. Pondero que, no meu caso, o carisma só começa a fluir a partir do momento em que posso ser o que devo ser, isto é, professor. Quando se reconhece que estamos na escola para aprender, com cientistas e pensadores que nos precederam e que eram donos de uma mente possante, resta compreendido que a atenção deve ser canalizada para as teorias e para os ensinamentos dessas personalidades retrocidadas, e que o alunado não é o alvo da atenção, do contrário, sua atenção tem de ser direcionada para o conteúdo visitado nas exposições. É por isso que a educação vai mal: a escola, o governo, as políticas de educação, estão em busca dos alunos, mas a educação só vai prosperar quando os alunos, – e não outros que querem fazer o que somente a eles incumbe, – estiverem em busca do conhecimento. O problema da educação está no modelo de relação posto e em vigência. Quando o conhecimento for mais valorizado do que ouro, e, por consectário, o professor for visto como o dono do mapa do tesouro, que conduz a esse cabedal, tudo irá bem. Os desocupados, esses tais sedizentes “influencers”, que, no fundo, influenciam cabeças tão tolas quanto as suas próprias, e que advogam que todo professor é um sujeito que está em sala de aula porque fracassou em tudo o mais, deveriam ter os lombos despidos e receber chibatadas em praça pública. Ato contíguo, a cerimônia seria seguida de menção honrosa aos professores destaques do município. Garanto-vos que umas poucas solenidades como essa colocaria os pingos nos is. Na hora em que pais de alunos-problema tiverem de pagar cestas básicas, e cumprir, ao lado dos filhos, serviço comunitário por mau comportamento dos mesmos, as coisas começarão a engrenar. Todavia, as iniciativas legais da Assembleia Legislativa de São Paulo, e de outras casas de leis, têm se mostrado um regador a irrigar ervas daninhas. Educação não é a realização de um dever indigesto, é um direito sagrado. A perda dessa noção, de que não se está diante de algo enfadonho, porém, de uma oportunidade ímpar, é a sutil diferença que aparta vencedores de perdedores, bem-sucedidos de fracassados, cidadãos engajados de periféricos. Uma vez compreendido isto, aí sim, a educação será luz!