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Idoneidade e Advocacia

Certo bacharel em direito, cujo nome desconhecemos por tratar-se de segredo de justiça, teve sua inscrição negada nos quadros da OAB/GO, sob o argumento de que era inidôneo. Irresignado, o sujeito atingido pela denegação ingressou em juízo, com mandado de segurança, requerendo comando judicial determinando a inscrição. Logrou êxito. Prolatou-se decisão de urgência dando provimento […]

Por Israel Minikovsky 16 min de leitura

Certo bacharel em direito, cujo nome desconhecemos por tratar-se de segredo de justiça, teve sua inscrição negada nos quadros da OAB/GO, sob o argumento de que era inidôneo. Irresignado, o sujeito atingido pela denegação ingressou em juízo, com mandado de segurança, requerendo comando judicial determinando a inscrição. Logrou êxito. Prolatou-se decisão de urgência dando provimento à pretensão. Em sede administrativa, a inscrição fora indeferida com fulcro no argumento de inidoneidade presumida, ante o fato de o solicitante figurar no polo passivo de diversas ações penais. Em grau de recurso, a liminar foi revogada. O juiz federal convocado, Marllon Sousa, da 13ª Turma da 1ª Região, aquiesceu ao entendimento da instância administrativa, ressaltando a independência das esferas administrativa e judicial, arguindo que é desnecessário que haja condenação na justiça para acatar a tese de inidoneidade. Eu penso que a declaração de inidoneidade, e o reconhecimento de seus efeitos, consistente em não poder ser incluído numa importante categoria profissional, faz muito sentido. Nisso, o Brasil é referência para o subcontinente latino-americano. Tenho notado que, em países vizinhos, não raro, a magistrada oficia no fórum durante o período diurno, protagonizando atividades de alta suspeição moral no contraturno, a ponto de atuar como atriz em produções para adultos. Nossos “hermanos” parecem não se incomodar com situações como estas. No entanto, para além da sabença mínima de que até mesmo na sua vida privada o advogado não pode fazer o que bem quer, aqui no Brasil, sinto o dever de contrapor um parâmetro reverso. Se, fazendo o que é errado, se perde a idoneidade, deve haver uma metodologia para readquiri-la, por mais dura que seja essa metodologia. O direito penal e o direito administrativo disciplinar não cumprem a sua razão de ser, se se restringem ao apenamento, sem propiciar uma vereda através da qual haja a reabilitação. Veja-se que, se o direito exige idoneidade, é natural que outros fazeres profissionais também estatuam suas próprias exigências, o que poderá redundar na supressão de toda possibilidade de empregabilidade desse excluído, o que o empurrará, pela falta de renda e integração social, à marginalidade e delinquência. É bem por isso, que deve haver um caminho para a autorredenção social. Note-se que, até a solicitação de inscrição nos quadros da ordem, o destinatário da decisão administrativa indeferitória pôde prestar vestibular, cursar ciências jurídicas, realizar o exame da ordem e nele ser aprovado, sem nenhuma advertência ou aviso prévio. Eu quero crer que, um ser humano que se dispôs a cumprir tantas formalidades acadêmicas, pode vir a ser tão capaz no campo da moral quanto o foi no campo da intelecção. O fato de estar cometido em tantas ações de natureza penal exibe uma biografia marcada pela ausência de referências, referências estas que o indivíduo procurou auferir cursando direito. Se, como se ensina na teologia, deve-se odiar o pecado e não o pecador, na seara jurídica, deve-se odiar o crime e não o criminoso. As decisões contrárias à perfectibilização da inscrição professam um credo: que a realização de um curso de ciências jurídicas, por si só, não redime um indivíduo. Realmente, algumas vezes as pessoas permanecem incólumes à mudança. Com efeito, quero crer que uma graduação em direito traz em seu bojo tudo aquilo de que um ser humano necessita para se tornar alguém melhor. Acredito no ser humano, e acredito no potencial transformador do conhecimento. Ao invés de simplesmente se abnegar a inscrição numa corporação de ofício, o Estado deveria acompanhar a trajetória desse acadêmico, inserindo-o num serviço ofertado pela assistência social, para integrá-lo à família, à comunidade e à sociedade. Fosse feito isto, ele não apenas reuniria todos os requisitos necessários ao exercício da advocacia, mas, imbuído dos pressupostos da política nacional de assistência social, tornar-se-ia um genuíno defensor dos direitos humanos. Porém, essa oportunidade foi perdida, pelo conselho de classe, pelo Judiciário, pelo Estado como um todo, pela sociedade. Tais circunstâncias deveriam nos incomodar, no sentido de refletirmos sobre o que desejamos com universidades e seus cursos. Apenas vamos formar profissionais, preterindo o aspecto da cidadania? O enfoque é puramente econômico? Por que não usamos as ciências jurídicas para a pacificação e harmonização sociais, a principiar pelos próprios formandos matriculados nestas graduações?

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